Chamo-me Fernando e tenho 50 anos. Acho importante revelar a idade antes de qualquer coisa, já que no universo homossexual em que vivemos esse fator é extremamente relevante, pois, quase sempre nós, “coroas/tiozões”, somos relegados a uma espécie de aposentadoria involuntária em virtude da nossa libido. Não podemos (ou não devemos?) sentir desejo. Expô-los, então, é quase uma afronta, um crime contra a humanidade, contra as pulsões sexuais dos corpos ditos perfeitos, que pululam pelos aplicativos e redes sociais em busca de sexo.
Não estou criticando as preferências de ninguém, até porque tenho as minhas e gosto que as respeitem. Apenas desaprovo àqueles que se acham no direito de deduzir que a sua escolha possa estar acima do bem e do mal em detrimento a todas as outras, acreditando que todos os demais que não se encaixem na sua percepção de realidade e pseudoperfeição devem ser relegados à plateia do oba-oba do sexo. Que o digam os corredores semiescuros das saunas, não é mesmo?
Enfim, após essa elegante introdução pseudofilosófica, vamos então ao propósito desta publicação? Vamos à putaria propriamente dita?
Estávamos eu e um amigo, Carlos, aqui, em meu apartamento, num sábado à noite, tomando vinho e jogando conversa fora, ritual que sempre repetimos quando estamos com muitos horários vagos em nossas agendas românticas, o que vem acontecendo com uma frequência assustadora nos últimos tempos. Carlos também é um cinquentão e, assim como eu, vem enfrentando um longo período de entressafra em sua “loca vida loca” a procura de um companheiro, independente do prazo de validade que o digníssimo poderá ter. Resumo da ópera: estávamos naquele exato momento refletindo sobre o absurdo de não ter UM PAU há uns bons (ou maus?) meses.
Vida que segue.
Ok. Muitos já devem estar se perguntando o motivo de nós, eu e o Carlos, não ajudarmos a apaziguar a folgança um do outro. Por incrível que possa parecer, existem aqueles tipos de amigos no mundo gay que preservam esse laço, o da amizade em “preto e branco” e não sentem a necessidade de colori-la. Raro? Sim, mas não a ponto de ser considerada uma lenda urbana.
E a conversa e o vinho seguiam rolando e também um filminho pornô — um coadjuvante quase ponta de luxo, recebendo olhares e comentários esporádicos, às vezes alguns divertidos, servindo, no final das contas, como mais uma muleta para a nossa noite de desabafos, lembranças e algumas muitas lamentações. Isso, claro, até sermos surpreendidos com o toque da campainha seguida de batidas na porta um tanto pesadas e urgentes. Era meu sobrinho, Lucas, que mora dois andares acima, com minha irmã, cujo marido a deixou por outra, há uns dez anos, e sumiu do mapa para nunca mais voltar.
Lucas entrou no meu apartamento como um foguete tão logo eu o atendi — mal deixando tempo para que Carlos retirasse o pornozinho da TV, que fica de frente para a porta —, e se jogou como um bloco de cimento sobre o sofá, onde começou a despejar um discurso de ira e frustração em relação à mãe, num só fôlego, sem sequer perguntar se estávamos disponíveis e dispostos a ouvi-lo. Como sou um bom tio, e o Carlos também como um bom “tio emprestado” que é, já que conhece o Lucas desde ele tinha uns cinco, seis anos, ficamos, cada um a uma certa distância do garoto e em completo silêncio, escutando toda a ladainha sem reclamar, apenas trocando olhares carregados de obviedades, afinal de contas, nenhuma novidade no que diz respeito à minha irmã colocar a religião que segue acima de tudo e de todos, sufocar meu sobrinho a ponto de não deixá-lo sequer andar sem camisa e policiar as garotas que tentam sem aproximar dele.
E os garotos também, já que teme, sabe-se lá de onde tirou essa informação, que a homossexualidade do tio seja hereditária ou contagiosa.
A propósito, minha irmã odeia que Lucas coloque os pés aqui, no meu habitat. Ela mesma não o faz. Nem no meu aniversário ou em datas festivas, como Natal e Ano Novo — nos falamos e esporadicamente, pelo celular. Acredito que na sua mente fanática e intolerante meu apartamento deva parecer uma espécie de Sodoma e Gomorra numa vibe século 21 ou talvez algo até mais obsceno, vai saber.
E o garoto seguia com seu rosário de reclamações enquanto entornava vinho goela abaixo sem também sequer perguntar se podia ou não beber. Bom, Lucas tem quase 20 anos e não sou eu e muito menos o Carlos que vamos ditar as regras do que ele deve ou não fazer, não é mesmo?
Depois de uns vinte minutos, eu acho, finalmente conseguimos compreender o ápice do descontentamento de Lucas, a gota d’água que o fez descer até o “inferno”, o impulso que deu alma e corpo ao seu protesto. A mãe havia tentado convencê-lo a segui-la num num retiro espiritual naquela noite (mais um de tantos que o menino já frequentou), retiro esse que se estenderia por mais três dias. E quase quis obrigá-lo, como se Lucas ainda fosse uma criança, tão logo notara a sua resistência, alegando que ele também fazia parte da congregação e bla, blá, blá. Lucas fincara o pé no chão, afirmando que não iria e pronto e com isso discutiram pela primeira vez. Minha irmã, claro, o ameaçou de todas as formas possíveis e imagináveis que a cartilha da tortura religiosa-psicológica poderia permitir. Ela perdeu, concluímos, ao menos temporariamente.
Depois de um tempo, nós dois, eu e Carlos, mergulhados num silêncio cúmplice e de saco cheio, decidimos dar um basta naquele círculo vicioso, passando a sugerir outros assuntos que pudesse afastar Lucas da enorme e sufocante sombra que o estava consumindo. Um paliativo, evidente, já que o problema dele com a minha irmã — e com a religião que deveria uni-los e não separá-los cada vez mais — seria uma árdua batalha a ser travada e que com toda certeza que pudesse existir no universo, não seria solucionada sobre meu sofá, naquele momento.
Demorou um pouco, mas funcionou. Conversas, risos, piadas e taças e mais taças de vinho e mais gargalhadas foram tomando conta da sala, até que meu sobrinho pediu para que colocássemos o pornô que estava na TV, retirado quase na velocidade da luz quando da sua entrada fulminante no apartamento, argumentando em sua defesa, diante da minha veemente negação, a curiosidade de nunca ter visto um filme onde dois homens estivessem fudendo.
Yes! Lucas utilizou a “valorosa expressão” sem nenhum resquício de vergonha ou culpa. Aleluia! Se ele tivesse ousado dizer “onde dois homens estivessem copulando ou fazendo sexo”, ou qualquer outro eufemismo, juro que iria tomar a taça de vinho da mão dele e mandá-lo pra casa com um pé na bunda.
Carlos me fitou um tanto ansioso, aguardando o meu “de acordo” para poder, ou não, liberar o filme, enquanto me mantive resistente por um instante, aliás, por um longo e quase infinito instante. Não por querer passar a imagem cínica de um tio responsável e exemplar, cheio de pudores — só Oscar Wilde sabe o que já vi e fiz pelos bares, noitadas e saunas da vida. É possível que minha resistência tenha bebido na fonte da hombridade, da dignidade consanguínea (oi?). Mas aquele clima começando a ficar despretensioso proporcionado pela constatação de ver Lucas menos “pesado”, a alegria daquela confraternização inesperada, e não vou mentir — e me julguem se quiser —, o gostinho ainda que indireto de uma pequena vingancinha contra minha irmã, acabou por me dar coragem em deixar que o menino assistisse a porra do filme, ou uma parte dele. O mundo é feito de coisas belas e sujas, não é mesmo? E como ele mesmo havia afirmado: “nunca havia assistido um filme onde dois homens estivessem fudendo”. Ou seja, para um bom entendedor, esse menino já deve ter visto trocentos ponozinhos héteros. Não seriam dois cacetes juntos que iria chocá-lo.
E lá estava Lucas, vidrado nas imagens dos dois corpos masculinos se pegando, se beijando, se acariciando com uma violência urgente; os dois homens mamando o pau um do outro sem nenhuma cerimônia para depois partirem para um 69 com um deles enfiando com vontade a cara no rabo daquele que estava por cima. Meu sobrinho assistia a tudo com uma expressão de surpresa e tensão e também um quê de desapontamento. Mas ainda assim, e não sei se por um impulso meramente sexual ou um ato propositalmente pensado, começou a apertar a bermuda, a alisar a virilha, aparentemente pouco se importando com a presença minha e a de Carlos. Eu e meu amigo, aliás, nos encarávamos, incrédulos, por trás do pescoço de Lucas, que naquela altura do campeonato já estava um pouco curvado para frente apertando cada vez mais a bermuda até de repente gritar um foda-se e arrancar para fora o cacete, duro, extremamente duro e dar início a uma punheta desesperadora ( e gostosa!), ao mesmo tempo que se jogava de volta para o encosto do sofá.
Não. Não me perguntem o que houve. Em um momento eu e o Carlos estávamos lá, nos fitando, surpresos, perplexos ante a ousadia de Lucas, à medida que revezávamos o olhar sobre o seu pau, aquele pau duro sendo manipulado, se destacando entre a braguilha aberta da bermuda numa ereção latejante, viva, pulsante, arrebatadora e que só a juventude plena e absoluta é capaz de proporcionar.
Não. Realmente não me perguntem como. Só sei que no instante seguinte estávamos nós dois, eu e Carlos, cinquentões ávidos e famintos, mamando, disputando aquele cacete branquinho, reto, não tão grande, ok, mas suficiente para nos causar uma felicidade tamanha a ponto de rirmos como se fossemos duas crianças que acabaram de receber um presente mais que desejado, à medida que ouvíamos Lucas, entre gemidos e gargalhadas, pedir, suplicar, ainda que sem muita convicção, para que tivéssemos calma e sendo ignorado sem pestanejar enquanto eu e meu amigo seguíamos engolindo, devorando, sôfregos, desesperados, o seu cacete, alcançando os seus pentelhos, não muitos, por sinal, até roçarmos a ponta do nariz na sua barriga, brincando de ver quem conseguia não se engasgar com facilidade.
— Como esse menino cresceu.
Carlos observava de vez em quando, entre debochado e cínico, fazendo questão em apertar o pau do Lucas entre as mãos para no minuto seguinte, em exata sincronia, buscarmos o rosto do meu sobrinho, lá, de baixo, do chão, onde já nos encontrávamos ajoelhados em meios às suas pernas. Lucas, apesar de tudo aquilo acontecendo, nos devolvia um olhar retraído, as maças do rosto um tanto vermelhas.
Não demorou muito para fazermos Lucas ficar de pé conforme invadíamos sua camisa com nossas mãos calmas e apressadas até nos levantarmos também para, então, alcançarmos o seu pescoço, cheiroso, onde deixamos nossas línguas trabalharem sem qualquer pudor para logo em seguida partimos para suas orelhas, depois o rosto, até tomarmos os seus lábios com nossas línguas mais e mais sôfregas ao passo que nossas mãos continuavam a se encontrar, dançando sobre o seu peito e barriga.
Entre esse ir e vir, eu e Carlos nos olhamos por um rápido instante, cúmplices, predadores vorazes e sem a menor cerimônia arrancamos, por fim, a camisa de Lucas num só golpe, assim como a bermuda e a cueca. Meu sobrinho não reagia, apenas gargalhava e gemia, pedindo calma, a porra de um pouco de calma, que nunca iria chegar, né?
Que visão maravilhosa e também surreal. Eu e Carlos nos rendemos por um instante diante da nudez de meu sobrinho. Nada, nada no corpo de Lucas podia ser considerado imperfeito, ainda que um corpo franzino de pernas esguias, torneadas, mas esguias, ainda que tivesse os braços longos, os poucos pelos… Rendemo-nos diante de sua beleza, a beleza de um efebo proibido com sua pele ainda sem as marcas do tempo. Rendemo-nos diante dos seus lábios escarlates finamente talhados, os claros olhos, a cabeleira ruiva… Reverenciamos a candura de sua mocidade sem hesitação, sem medo de parecermos angustiados e por que não patéticos diante de tanta beleza.
Eu e o meu amigo acariciamos os cabelos de Lucas, seus ombros e seu peito com uma surpreendente morosidade, como se quiséssemos ter a certeza de que aquilo que estávamos tocando era real. E depois fomos descendo, também sem a mínima pressa, pela barriga, passeando pelas pernas, nos colocando, enfim, novamente de joelhos, trocando um sorriso inebriante e sarcástico antes de atacarmos aquele cacete pulsante diante de nós dois.
Brigamos. Sim. Brigamos pelo pau do menino, de novo e de novo, indo e vindo no seu caralho, no seu saco, na sua virilha até decidirmos levá-lo para o quarto e jogá-lo sobre a cama com certa violência, tirando nossas roupas no segundo seguinte, pouco nos importando com a gritante diferença entre nossos corpos: dois coroas fortinhos, com “uma barriguinha que não lhes pertenciam”, como diz o velho ditado, contrastando com a perfeição juvenil de Lucas. Por sinal, o garoto se mostrou um tanto perplexo, mas não lhe demos muito tempo para pensar — ou desistir —, pois pulamos sobre o colchão e voltamos a atacar o seu caralho, a sua virilidade decerto desejada por tudo e por todos em sã consciência, e que se manteve dura como uma rocha. Ainda bem.
***** CONTINUA *****